MAS SOU EU 4 – eu juro que que paro com esse assunto!
[Se cada um tem do outro uma imagem, que é o outro para si, esse ente, o que é? Não é realmente o outro, porque se ele foi concebido por quem vê, de um ponto de vista específico, não pode conter todos aqueles pontos de vista pelos quais aquele outro pode ser determinado, e necessária e principalmente, não pode conter a perspectiva através da qual o outro enxerga a si mesmo. Então, esse ente é ainda uma terceira criatura indefinida, viva em dois reflexos inassociaveis: como se mostra a quem a formaliza a partir de uma matriz, que é o outro, e como se mostra a esse outro, que é e se percebe enxergado pelo mundo e tenta por sua vez enxergar o que é seu eu que o mundo vê. Essa criatura semântica, sobrenatural e abstrata, guarda de nós, a mesma distância inexpugnável que nós temos uns dos outros. Carrego comigo, dentre meus muitos eus, aquele que é a minha idéia do que seja eu como você percebe; você leva consigo esse meu eu que você entende e cuja imagem eu suponho. Assim possuímos, além de um exército de eus — nossos ou derivados —, uma infinidade de estranhos, que são os outros idealizados por nós mesmos — tantos quantas são as pessoas que conhecemos ou até mesmo as que vemos de relance e das quais guardamos apenas impressões. Entretanto, se estes outros que vivem em mim são frutos do meu ponto de vista, eles não podem ser senão outros eus; droga!] Eu tenho um problema: tudo é Francisco, mas eu não.
Pode ser que, indo por aí, eu entenda o que é estar no mundo, de que é composto o Eu, o que é ser parte de um todo. Mas não posso entender o mundo. Porque não me entendo, porque assim não me reconheço nele, porque não sou "Francisco".
Deve ser por isso que não suporto meu aniversário. Ou o aniversário do Francisco, essa celebração dos outros de algo abstrato e que não sou eu, que pra mim é indefinido, e que para cada um é uma coisa própria.