Foi assim: quando começou a doer o joelho, eu parei. Parei, encostei num muro qualquer e ia levando a mão ao joelho – que dava a impressão querer desmontar – quando, exatamente nesse momento, caiu o braço. Eu fiquei que nem bobo olhando pra ele, ali, no chão, como se não fosse meu. Não parecia mesmo meu, ainda mais bobo que eu, jogado que nem lixo, sem função. Depois, não sei se por reflexo, achei melhor pegar o braço e levar comigo. Pronto, nesse ponto foi que caiu a perna. A direita. Me desequilibrei todo, opa!, e tive que me escorar de vez no muro. Lembrei de quando eu era pequeno, de quando eu arrancava os braços dos soldadinhos de plástico e eles eram exatamente como aquele lá, estáticos, ridículos, um pouco dobrados no meio, como se num movimento interrompido. Nisso comecei a ficar tonto e tive medo de que se me descolasse do corpo a cabeça. A solução que encontrei foi me jogar no chão enquanto ainda tinha um braço pra segurar as idéias. Que diabos!, foi o bastante pra outra perna também; eu caí pra um lado, ela pro outro. Agora restava-me apenas um braço que achei melhor não mexer, pois precisava dele pra manter a cabeça no lugar – na hora quase ri do trocadilho infame. Paradinho que estava, senti lentamente que ia perder o último membro superior. Esse nem ia cair; foi se destacando lentamente do ombro, sob a ação do próprio peso. Mas, depois de solto, estranho, continuou com a mão sobre a minha cabeça, perpetuando de forma inútil e cômica o meu esforço pra não ficar sem ela também, numa espécie de cafuné congelado, uma tentativa de consolo daqueles dedos que não eram mais meus. Eu estava com a cara numa minúscula pocinha imunda e, cada vez que eu expirava, eu via bem de perto umas ondinhas parecidas com aquelas que acontecem quando a gente joga pedrinhas no lago. E, como não tinha lhufas pra fazer, fiquei lá achando que vida é mesmo muito besta.