Iam dessa forma os dois, o pai puxando o menino pela rua.
– Tenha paciência, menino! Já é a milésima vez que você pergunta!
O homem ia, entre resoluto e resignado, andando a passos largos e olhando pra frente; a criança ia, quase suspensa pela mão do pai, misturando um pouco suas perninhas curtas e olhando pra tudo que passava à sua volta com a curiosidade e o espanto próprios da idade. Lá pelas tantas viu algo que, mais que o resto, chamou-lhe a atenção;
– Pai, olha ali um homem desmontando!
– Meu filho, Não Existe Gente Que Desmonta – com toda a paciência do mundo.
– Mas olha só…
Voltou-se, já sem tanta paciência, pronto pra dizer pro rebento que não se deve mentir, é feio inventar essas coisas e estamos com pressa, mas ao olhar pro lugar que a criança indicava, viu que o homem, efetivamente, caía aos pedaços.
– Meu [d]eus!
Agora estava o pai boquiaberto, assumindo o mesmo espanto pelo mundo com que o garoto viera até então, enquanto este comprazia-se, ria baixinho. Via-se de longe o deleite profundo em seu rosto. Ficaram os dois ali, assistindo aquilo. Subito, o filho se fez sério:
– Mas pai, quando eu crescer, vou desmontar também?
O pai, que no fundo não sabia, mas que achava que sabia e – justamente por isso – nunca desmontara, respondeu sério e taxativo:
– Claro que não! É filho meu! – e falava mais pra si que pro moleque.
– Mas como é que você sabe?
– Eu tenho certeza.
– O que é uma certeza?
– Olha, isso não vem ao caso, o que acontece é o seguite: eu estou te dizendo. Gente Que Desmonta Não Existe.
– Não existe gente que desmonta?
– Não. Dessa vez é diferente: Gente Que Desmonta Não Existe.
– E aquele moço ali?
– Pois é, não existe.
E continuaram lá, observando o penoso e pitoresco espetáculo. Até o fim.