Ela dirige noite adentro. Minhas mãos estão frias. Precisamos encontrar um canto pra parar. Quem sabe, comer. Por que tanto silêncio aqui dentro? Não temos lugar nenhum pra ir. Já não entendo mais. Prefiro me calar. Só posso me calar.
Tem vezes em que nada no mundo é mais difícil que esperar.
Ela dorme. Toda noite, no meu quarto, quando fecha os olhos, imagina que chegamos lá. Que diminuímos, que pegamos a última à direita e que podemos parar. Ela vira pro lado e tem o sono tranqüilo. Vê a viagem acabar. Eu preciso chorar bem baixo pra ela não acordar.
Eu vejo uma placa passar mas não digo nada.
Me pergunto quantas ela terá visto.
Há uns dias, no começo de tudo, ela riu quando eu disse que duas pessoas num carro podem ter destinos diferentes, um indo e o outro voltando, que um pode chegar e o outro nunca, que um segue enquanto o outro parou já tem 30 quilômetros. E que um pode não ver enquanto o outro passa – e chama! – no carro ao lado.
– Olha. Ali, um posto. Preciso ir ao banheiro.
Com um pouco de gasolina, o carro pode seguir pra sempre. É sempre noite. A realidade sempre recortada nos faróis baixos – e a estrada, o mundo todo cabe ali. É tudo de que precisamos mas nunca é o suficiente. Talvez por isso continuemos sempre em frente.
Hoje, sei menos que nunca a diferença entre chegar e parar. Então continuar é o menos complicado. E o que se perde no caminho (se eu não estiver mais aqui ou se você foi pra outro lugar) eu prometo não dizer.
Já não estamos mais aqui, mas continuamos indo, os dois, no mesmo carro.
– Você enche o tanque enquanto eu vou ao banheiro? Não quero demorar aqui.